Louise defende o anarquismo, sente uma profunda revolta contra a sociedade e os seus actos e considera que esta teoria seria a solução dos seus problemas. Baseia-se em grande parte no pensamento de William Godwin e naquele que é exposto n’O banqueiro anarquista de Fernando Pessoa. A sua postura e apatia que sente pela sociedade é semelhante às que são expostas no filme Slacker de Richard Linklater.
Slacker – Richard Linklater
Retrata um dia de uma geração muito preguiçosa e apática, a dos adolescentes dos anos 90, revoltados com o contexto em que se inserem. O anarquismo é um tema exposto nas suas conversas.
Louise é também uma jovem revoltada perante a sociedade que a rodeia e acredita que o anarquismo seria a solução dos problemas da humanidade.
Anarquistas e anarquismo – James Joll
William Godwin (1756-1836) foi um jornalista inglês, filósofo e politico. Foi um dos primeiros defensores do anarquismo. O princípio fundamental do seu pensamento político assenta na crença em que a justiça e a felicidade estão inevitavelmente interligadas. Considera a prática da virtude como o verdadeiro caminho para a felicidade individual. Desta forma, uma sociedade baseada na justiça seria uma sociedade em que os seus membros seriam necessariamente felizes.
Esta teoria tem por base uma opinião profundamente optimista da natureza humana. Godwin considera (sustentando-se na doutrina de Hume) o Homem nascido sem quaisquer ideias inatas. Assim, o seu espírito e carácter são susceptíveis de serem influenciados por factores exteriores a si. Esta vulnerabilidade dos seres humanos a todas as formas de pressão intelectual e moral, é ao mesmo tempo a sua fraqueza e a sua força. Fraqueza porque dá aos governos um poder quase ilimitado de controlar os seus súbditos. Força porque pode aprender a viver pacificamente com os seus vizinhos numa comunidade.
Louise vê apenas o lado mau da vulnerabilidade do ser humano, porque considera-o como algo tão perturbador que não consegue dar valor a algo que traga de positivo.
Godwin considera que a razão do crime é a insatisfação das necessidades de vida. A solução que apresenta é a abolição da propriedade. Ao serem irradiados os motivos de vaidade e ambição e de se ser mais do que o outro será exigido pouco da sociedade e adoptada uma verdadeira escala de valores.
Godwin é um verdadeiro anarquista na medida em que não encara a propriedade como algo a ser explorado em comum, mas apenas na medida em que seria utilizável por quem quer que dela necessitasse.
“Tudo o que normalmente é compreendido pelo termo cooperação é num certo grau um mal… Se eu tive de esperar para comer e trabalhar em conjunto com o meu vizinho, ou deve ser numa altura mais conveniente para mim, ou para ele, ou para nenhum de nós. Não podemos ser reduzidos à uniformidade do relógio.”
“Mas então terei eu que, a determinadas horas, deixar o museu onde estava a trabalhar, o recesso onde meditava ou o observatório onde examino os fenómenos da natureza, para me dirigir a uma sala só destinada a refeições, em vez de comer como a razão me ordena, na altura e no lugar mais adequado às minhas ocupações?”
William Godwin
Este é um dos aspectos com que Louise mais concorda. As pessoas não devem depender umas das outras e quase todos funcionam assim. Pensam ser livres mas são limitadas pelas acções daqueles que as rodeiam e reduzem-se àquilo que os outros fazem e pensam.
A família é vista por Godwin como uma instituição duplamente errada, porque envolve subordinação de personalidades e baseia-se na propriedade, não havendo necessidade dela. A sua opinião relativa ao sexo é típica da sua opinião da natureza do homem.
“Cultivarei assiduamente as relações sexuais daquelas mulheres cujo talento me perturbar da maneira mais forte. Mas poderá acontecer que outros sintam por ela a mesma preferência que eu? Isto não é, porém, problema (…) as realçais sexuais são algo bastante trivial”
Louise não entende a dependência que as pessoas sentem por alguém e as relações amorosas. Vê-as como fraquezas do ser humano e como mais um factor que concretiza a sua vivência dentro de uma caixa, ou seja, sem liberdade. Considera que todos devem ser livres de obter prazer de quem quiserem, mesmo que existam mais pessoas interessadas e que o façam simultaneamente. Apesar de não se conseguir relacionar com ninguém, por se colocar no exterior da sociedade e ver as coisas de fora, considera que a sociedade que observa deveria funcionar com base nesse princípio.
O banqueiro anarquista – Fernando Pessoa
Fernando Pessoa caracteriza neste livro um anarquista na sua essência como um revoltado contra a injustiça de nascermos desiguais socialmente. É alguém que se revolta contra as convenções e ficções sociais que se sobrepõem às realidades naturais.
As pessoas nascem para ser livres, serem homens ou mulheres. Não para serem ricos ou pobres, católicos ou protestantes, portugueses ou ingleses. Tudo isto ocorre, segundo o banqueiro anarquista (e Louise) através destas ficções sociais que não são naturais e são impostas ao Homem pelo exterior.
O dinheiro, o estado, a família e as religiões são ficções que estorvam as realidades naturais. O anarquismo pretende livrar-se de todas estas influências e ficções.
Esta personagem caracteriza a religião católica como algo que não faz qualquer sentido dentro deste princípio. Alguém que acredita nesta única vida e não na vida eterna, não admite qualquer lei que não a natureza, que se opõe ao estado, ao dinheiro e ao casamento não faz sentido defender uma religião que tem como expoente máximo o céu e assenta no sacrifício pelos outros e pela humanidade.
Bibliografia
JOLL, James; Anarquistas e Anarquismo; Edições D. Quixote
PESSOA, Fernando; O banqueiro anarquista; Editora Ática